quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Capítulo 5 – Mônaco (parte 2)

Capítulo 5 – Mônaco (parte 2)

Os gritos dos fãs, as bandeiras erguidas e finalmente o alto-falante, anunciavam o fim da corrida. Dois pit stop e um acidente de outro carro não tiraram a ânsia de vencer da garota. Era uma das primeiras experiências da velocista, isso disputando com profissionais. O resultado, porém, não fora aquele que ela esperava. Segundo lugar. Porém, Mônaco aclamava-a mesmo assim, era um passo fenomenal para qualquer piloto em formação correr ao lado de veteranos. 

Talvez a imaturidade da loira a impedisse de enxergar isso. Irritara-se tanto que mal falara com seu treinador. Yoshiro, entretanto, já estava acostumado a esse tipo de reação, o gênio de sua protegida poderia ser terrível. O homem apenas suspirou quando a viu passar; deixaria que descontasse sua frustração nos pneus do carro. Chutava-os sem cerimônias, num local mais isolado do autódromo. Michiru, que inocentemente ia ao seu encontro, radiante pelo resultado, logo mudou de expressão quando viu a parceira tirar a jaqueta vermelha e jogá-la no chão. Contudo, antes que pudesse dar mais um passo, alguém comentou:

“É melhor não ir agora, espere até ela chutar alguns pneus...”

A voz grave fez com que a violinista olhasse para trás. Descobrira ser Yoshiro. Estava com as mãos nos bolsos enquanto fitava a corredora ao longe.

- Murata...san? – a jovem torcia para que o sobrenome estivesse correto.

“Acho que não fomos devidamente apresentados, Tenoh costuma esquecer dessas formalidades...”

- É verdade. – sorria – Mas não seja por isso, me chamo Kaioh Michiru.

“Michiru? Ouvi Tenoh dizer esse nome durante alguns intervalos dos treinos. Eu só não sabia que era a Michiru dos Kaioh.” – Yoshiro viu a jovem desviar brevemente o olhar, parecendo se incomodar quando o sobrenome foi mencionado.

- Infelizmente, é um mal que me persegue. – dizia com um sorriso leve mesmo não estivesse nada confortável ao ser lembrada do nome da família. Pensara que estaria livre desse tipo de situações em Mônaco. Muito embora, não pudesse culpar o homem. Era seu conterrâneo e como tal, provavelmente conhecia sobre a Família Kaioh.

“Acho que eu gostava mais dela quando não falava tanto...” – Murata suspirava, enquanto a Sailor dos Mares ria, discretamente. Observavam a loira entrar num dos estacionamentos privados do autódromo. Lá, andava em círculos, provavelmente praguejando.

- Murata-san, desculpe perguntar, mas há quanto tempo se conhecem?

“Desde o final do ano passado. Como treinador, sempre andei pelos colégios à procura de talentos. Tenoh era uma das poucas que possuía verdadeiro potencial... nunca vi alguém correr ou pilotar daquela forma.”

- Imagino que foi difícil convencê-la a participar de competições mais sérias...

“Um pouco. Mas na época parecia querer sua independência o quanto antes. Sua relação com a família não era das melhores... Ela já deve ter comentado com você.”

- Bom... – Neptune desviava o olhar, Uranus sempre evitava falar sobre seu passado. 

“Sabe, quando ela corria no antigo colégio, várias garotas espremiam-se na grade que contornava a pista. Como gritavam... meus ouvidos ainda doem só de lembrar. Seguravam cartazes e acenavam com suas toalhas de Educação Física. Esperavam só o apito final, para entregar cartinhas e outras coisas. E ela, mesmo se aproximando para receber aqueles objetos, ao chegar no vestiário jogava tudo no lixo.”

- Ela... disse o motivo? - perguntou Michiru esforçando-se para fazer sua ansiedade em saber a resposta casual.

“Eu tomei a liberdade de perguntar, afinal aquelas garotas tinham se esforçado para fazer algo por ela. Foi quando me respondeu...”

Elas não estão interessadas em mim realmente, só pensam que estão... tudo que possuem é a minha imagem. Não me conhecem.

“Então eu respondi que não a conheciam, porque ela mesma não se deixava conhecer. Por isso, como poderia querer que vissem além de sua imagem? Ela pareceu refletir um pouco, até que disse...”

Esse tipo de coisa notamos no olhar, nenhum dos que vi se conectou comigo... Além disso, Todas as vezes que iniciaram algum papo comigo, não tinha conteúdo e os elogios...eram vazios.
Por um momento, Neptune ficara sem fôlego ao ouvir o que o homem dissera. Poderia Haruka, mesmo inconsciente, ter esperado por ela? Seria a ligação de eras que havia despertado? A expressão pensativa da jovem fora reparada pelo treinador que, intrigado resolvera comentar.

“Então você é a causa...” – afirmara o homem sem reservas.

- Não entendi, Sr. Murata.

“Aquela garota tem outro olhar atualmente. Sei que não sou um exemplo de sociabilidade, mas antigamente eu daria uma festa se conseguisse um bom dia daquela criança.” 

- Não acho que eu faça tanta diferença assim, Murata-san...

“Saiba que, ela não convidaria ninguém que não gostasse para fazer companhia nessa viagem. Disso eu sei.”

Michiru sorriu, antes de virar o rosto vermelho. Internamente agradecia ao homem pelas valiosas informações. Aquela conversa fizera sentir-se tão importante no relacionamento com a outra Sailor... O fato de ser o pivô da mudança da loira lhe fazia imensamente feliz. Pois, a própria Haruka, lhe dera um motivo também pelo qual lutar. Ainda com um sorriso no rosto, descia da arquibancada, indo finalmente ao encontro da velocista.

[...]

- “Ok... sem parabéns, então...” Haruka?

- Hum? Ah, Michiru... não sabia que estava aí...

- Ah, não se acanhe, pode continuar a amaldiçoar. – a jovem riu – Eu aprendo rápido. – Neptune tentava amenizar o clima, mas notara que sua companheira não rira. – Me perdoe, não falei pra zombar de você, Haruka.

- Eu sei.

- Haruka, outras oportunidades estão por vir. E sabe, eu não vi diferença entre você e os outros, estão no mesmo nível. Hum, pensando bem a única diferença é que você é incomparavelmente mais atraente. – Neptune deixara seu tom de voz o mais gentil possível. Sorria ao ver a corredora suspirar e se encostar no veículo.

- Eu sinto que... não me esforcei o bastante.

- Como é?! Ora, Haruka...que exagero... Se você acelerasse mais um pouco aquele...treco, eu ia ter um ataque cardíaco. – brincava.

- Hum, então ficou preocupada comigo? – aproximava-se sorrindo. A violinista comemorava, conseguira mudar a expressão da parceira.

- Se eu fiquei preocupada? A cada volta meu coração dava cambalhotas... – riu. – Haruka, sei que no momento ainda está bastante chateada, mas depois vai perceber o ótimo resultado que conseguiu. E... ainda que não me veja, saiba que sempre estarei torcendo por você, Te-noh. – sorria.

- Arigatou. – falava, mais calma pelos dizeres da jovem – Antes que me chamem ao pódio, o que acha de... um prêmio de primeiro lugar?

- Hum... e o que seria? – envolvia a loira passando os braços pelo seu pescoço.

- Ora, seus beijos...

Neptune sorria à sugestão e provocava a corredora passando levemente seus lábios nos dela. Afoita, Haruka puxou-a pela cintura diminuindo ainda mais a distância. Contudo, antes que pudesse concretizar o ato, um dos alto-falantes citou os nomes dos pilotos, para que comparecessem ao pódio.

- Ah, princesa...eu tenho que ir.

- Certo. Boa sorte... – Neptune sorriu e apontou a multidão que se aglomerava perto do pódio. Haruka soltou o muxoxo e foi ao encontro do alvoroço.

Cumprimentando os colegas, a velocista sobe ao pódio para receber o enorme cheque representativo que comumente davam aos pilotos; os fotógrafos se amontoavam em frente para conseguir uma boa foto e meninas gritavam pedindo autógrafos aos pilotos de Fórmula 1. Escapando de uma estressante coletiva, a loira respondera algumas perguntas básicas sobre como se sentira ao correr ao lado de grandes nomes. Aos poucos, a jovem conseguiu se retirar da agitação para ir ao encontro de Michiru...

- Acho que sobrevivi. – suspirava.

- Uhum...e quase que aquelas "tietes" não saem... – Comentou Michiru olhando-as com reprovação.

- Ora, mas o que é isso? – apontava para o rosto da jovem. 

- Isso o quê?

- Que estranho... – se aproximava – Isso é...ciúme de mim no seu olhar? – disse Haruka com um sorriso carregado de petulância.

- N-Não! – a jovem cruzou os braços, virando-se para esconder seu rubor. – O que é tão engraçado? – disse Michiru ao ver Haruka gargalhar. A outra Sailor apressou uma explicação – Eu não estou...não foi por...argh!

Em vão.

- Ei...não precisa ficar bravinha, só estava brincando...elas não significam nada pra mim Michiru. – disse a corredora puxando pela cintura – Vamos, eu quero que me faça esquecer da derrota de hoje. Sei que só você consegue...

- Consigo é? – Michiru deu um largo sorriso, deixando-se envolver num abraço.

- Hã? O que raios estou fazendo no autódromo? – olhava para cima, brincando.

- Está indo embora. Aliás, nós estamos.

- Bom...pra onde vai me levar? Deixo você dirigir o carro que aluguei... – a jovem sorriu mostrando-lhe a chave.

- Ara, se eu fosse você, não deixaria...nem pelo carro, e nem pela nossa própria vida...

- P-Por que? Você sabe dirigir, não sabe?

- Não! – ria – Pra você isso deve ser mais fácil do que “andar para frente”...mas eu não faço ideia...

- Oh, perdão... Bom, mas saiba que não é difícil, se torna tão automático depois de um tempo, que você "só dirige", entende? Façamos o seguinte, quando voltarmos ao Japão, eu te ensino. Que tal?

- Não se preocupe, eu entendo sim. Hum, eu só não sei se vou conseguir... você vai ter que ser muito paciente... 

- Como você foi comigo? Se teve paciência pra ser minha “sensei”...ser a sua, é um prazer pra mim. Então, pra onde vamos? Você escolhe, eu dirijo. Se bem que, temos uma conversa pendente, lembra? Antes que me chamassem ao pódio... – disse Haruka, colocando o braço em volta dos ombros dela e puxando-a novamente para perto.

- Não sei, faz tanto tempo que eu vim aqui que... – Michiru se calou ao finalmente perceber o que a velocista desejava e não pôde evitar corar.

- Michiru?

- S-sim? A-ah...então...é...escolha você...

- Bom...deixe-me ver... Que peça estaria passando hoje? – entrando no carro, a Sailor pega no porta-luvas o jornal que continha a programação cultural do dia – Cinema, concertos...estou na dúvida e... Oe princesa, sente também.

- S-sim. – olhando para o chão, se senta – “Será que desistiu da idéia? Talvez só estivesse brincando. Tola. É melhor que a relação esteja nesse ritmo, quer dizer, se formos depressa demais, podemos...”

- Por que está corada? – a velocista encostava seu nariz no da jovem, que assustada, se afastava rapidamente.

- P-por coisas assim! – corava. Uranus sorria, adorava desbancar a garota.

Olhando mais uma vez para o jornal, a corredora nota um evento que poderia interessar sua parceira. Um dos museus da cidade expunha esculturas de um artista novato. Uranus realmente não estava tão entusiasmada pela notícia que lera, mas divertir sua amada era o mínimo que podia fazer. Afinal já havia sido compensada, a companhia de Michiru era tudo o que poderia querer naquele momento.

- Ei, está havendo uma exposição neste museu. Você quer ir?

- Claro! Mas não tem compromissos a cumprir?

- Não, estou à sua disposição, princesa.

- Essa cordialidade toda é influência por Mônaco abrigar a realeza? – ria.

- Hum... não, eu sou perfeita assim naturalmente. – Uranus concluía cinicamente, passando a mão pelos cabelos. Michiru suspirava. Aos poucos se acostumara com as crises narcisistas da parceira.

- Sua cabeça não esquentou demais dentro daquele capacete?

- E-Ei!

Após um merecido descanso no hotel, as garotas deixavam o quarto, finalmente dando-se ao luxo de entretenimento. A velocista sorria ao olhar para o lado e ver a empolgação de Michiru. Neptune talvez pensasse ser impossível arrancar a amante e passar um dia em um museu. Agora estava radiante ao pensar que a iniciativa não tinha sido dela. Algumas quadras depois as duas avistam o local. Pequeno e de bom gosto, como muitos dos estabelecimentos da cidade.

A Sailor dos Mares exibia um sorriso ao colocar os pés no lugar. Passos lentos logo ganharam velocidade. Reconhecera dois quadros. Não era seu pintor favorito, mas suas obras eram intrigantes. Enquanto a jovem fazia uma análise mental do que vira, Haruka rodeava uma escultura de madeira perto dali.

A peça prendera sua atenção dada sua complexidade. Na base, uma boca humana aberta mostrava um punhal saindo dela. Na ponta, minúsculos órgãos. 
Nesse meio tempo a violinista parava em frente a outro quadro. Tema bíblico. Salomé dançando ao lado da bandeja com a cabeça de João Batista. Enquanto observava a composição de cores da tela, a loira juntava-se novamente a ela.

- Acho incrível o trabalho de sombras nesse. comentou Michiru sem tirar os olhos da tela.

- E eu nunca vi alguém tão feliz dançando ao lado de uma cabeça. – Uranus dizia despreocupadamente com uma das mãos no bolso, enquanto Michiru tentava não rir alto.

- Sabe, tive oportunidade de conversar um pouco com Murata-san hoje.

- Verdade? Tenho medo de saber o quê... – riu a jovem.

- Ora, Murata-san é uma boa pessoa, Haruka.

- É!? Nunca notei... – Uranus colocava uma das mãos no queixo, pensativa. Neptune sabia que a Sailor estava brincando, mas tentou esclarecer.

- Pode falar o quanto quiser, mas acho que se gostam. – a corredora sorriu, era bem verdade.

Michiru parecia incansável. Andando de um corredor a outro maravilhava-se com cada obra. Era irrelevante se achava brilhante ou não. A simples contemplação das diversas – e por vezes bizarras – formas, cores, texturas e sentimentos de cada artista impressos em cada quadro lhe era prazeroso.

Haruka cumpria bem seu papel, seguindo-a por toda galeria, ouvindo atentamente os comentários perspicazes da jovem. Sorria enquanto escutava, pois cada palavra saía de maneira apaixonada. Michiru era uma artista afinal. Uma tela em especial chamou a atenção da violinista. Duas silhuetas acomodavam-se num pequeno cubo; este se encontrava dentro de um maior. Não tinha título, só a data. Pensativa, Neptune fitou a pintura por alguns minutos, antes de despertar e ver porque seu coração acelerara. Haruka, ali, naquele corredor havia entrelaçado seus dedos nos dela. Olhava fixamente para o quadro e, mesmo corada não mudou sua ação.
Talvez, a expressão tão concentrada da Sailor dos Mares tivesse atraído-a. Não importava. O único e quase inaudível som que se escutara era da respiração das jovens; especialmente o da violinista que estava admirada pelo ato. Seu coração aos poucos se acalmava, quando ouviu uma breve e inesperada sentença.

- Te amo. – Uranus confessara sem desviar o olhar do quadro. Se encarasse a jovem ao lado, talvez sua coragem desaparecesse. Acompanhar a Sailor naquela tarde fora decisivo. Cada gesto, sorriso e comentário provaram o quanto amava aquela garota. Por que privá-la de ouvir algo que sentia com todas as suas forças?

Aos olhos de Neptune o espaço colorido da galeria tornara-se cinza por alguns segundos. Aquela declaração fizera o tempo parar. O coração por sua vez, batia descompassado. Diminuindo a distância, Michiru deixou a mão da velocista para segurar seu braço. Encostara a cabeça no ombro da parceira e fitou o chão. Superando o nó na garganta e o rubor, a jovem, quase sussurrando dizia: “Eu também te amo. Muito.”

Haruka deixava escapar um sorriso, para em seguida fitar Neptune. Suspirava. Finalmente conseguira pôr em palavras o que sentia. E, antes que o silêncio se tornasse incômodo, Haruka o cortou, fazendo um comentário qualquer.
- Amanhã iremos voltar ao Japão... O tempo realmente passou voando por aqui. – ao falar, a loira notara a violinista absorta em pensamentos. – Em que está pensando? – indagava com um sorriso.

- Pensando não, “sentindo”... – a Sailor olhava brevemente o Aqua Mirror em sua bolsa.

- Viu algo, Michiru?

- Haruka... precisamos voltar o quanto antes pra casa, o mal atacará novamente...em breve. Fico apreensiva ao pensar quem será a vítima.

- Então, hora de colocar meu treinamento à prova... Vai ser interessante.

(continua) 

Nenhum comentário:

Postar um comentário