sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Capítulo 20 – Dó Ré Mi Improvisado

Capítulo 20 – Dó Ré Mi Improvisado.

“A frase estava melhor na minha cabeça. Quer dizer, bem melhor. Narumi-sensei me olhava com total descrença, imaginando provavelmente se eu teria batido com a cabeça em um piano. Bem, eu não poderia culpá-la. A mídia vendia minha imagem como prodígio das maratonas e corridas. Achavam que a única Ré conhecida por mim era da marcha de um carro. Dali, apenas Michiru sabia da minha verdadeira paixão por música clássica...”

Narumi pôs a mão no queixo e arqueou uma sobrancelha, imaginando se a história da loira era pura brincadeira ou muita pretensão.

- Estou vendo que não acredita em mim. – disse a corredora com impaciência. – Posso provar se quiser, é só irmos à sala de música e...

A mulher levantou a mão parando a Sailor e deu um sorriso rápido. Parecia ligeiramente empolgada com a revelação.

- Não tenho tempo para isso agora, Tenoh. Mas peça a Nakamura-san um minuto para acompanhá-lo à sala de música, ela verá como aproveitar seu...talento.

A velocista sorriu e curvou-se brevemente agradecendo Narumi, que entrou na sala de aula novamente. Outro aluno a chamara.

Compenetradas na atuação, Michiru e Mitsune não desviaram os olhos uma da outra e continuaram seu diálogo sob olhar atento de Eri, que se juntara à roda dos intérpretes. Takeo espiou por cima do roteiro e viu Haruka se aproximar devagar, discretamente.

- Eri-san, posso falar com você um instante? – a loira sussurrou por trás da menina, que se virou.

- C-Claro... – respondera Eri acanhada. Haruka produzia esse efeito nela.
As duas deram alguns passos para longe dos outros alunos e Eri esperou por uma explicação.

- Estive falando com a professora e ela disse que a decisão era sua.

Uranus escolhera sabiamente o que dizer. Havia notado que Eri achava formidável dar a última palavra em qual fosse o trabalho.

Eri franziu o cenho e Haruka prosseguiu.

- Sabe, as músicas da peça poderiam ser tocadas ao vivo. Toco piano e achei que...

- Sério?! – a voz de Eri saiu esganiçada, atraindo a atenção dos jovens que ensaiavam.

A velocista passou a mão na nuca, sabendo que era tarde demais para desistir da ideia.

- Isso é maravilhoso, Tenoh-kun!

Eri juntou as mãos e seus olhos faiscavam, pensando no sucesso que a peça poderia ter. Michiru baixou o roteiro e olhou a amante, confusa pela presença dela.

- Gente! – acenou Eri aos colegas que ensaiavam. – Tenoh-kun sabe tocar piano!

Os alunos se entreolharam e Michiru ergueu uma sobrancelha. Achava que deveria manter segredo sobre tal habilidade.

- Se divulgássemos isso em um panfleto, podem imaginar como o teatro ficaria lotado? – disse Mitsune juntando-se a conversa e Eri concordou com a cabeça.

- Apesar de ser interessante... – falou Takeo aproximando-se – Por que não poupar trabalho e simplesmente tocarmos um cd de música clássica na hora?

Eri empertigou-se. Seus olhos brilharam de repente e Takeo deu um passo para trás.

- Porque isso seria o comum a fazer! Peças teatrais de colégio não se diferem muito das outras em questão de produção. Ninguém espera muito de nós, alunos. Não quero que essa peça seja só mais um projeto para o festival da escola. – respondeu Nakamura.

O intérprete de Malvólio, Hideki, coçou a cabeça antes de falar.

- Mas é exatamente o que essa peça é, Nakamura-chan. No final das contas, nós só queremos passar nessa matéria e ter umas férias de Narumi-sensei.

Takeo deu uma risada e olhou de Haruka para Eri. Enviesou o sorriso.

- Por que não vamos todos no intervalo à sala de música apreciar um concerto privado? – propôs o rapaz.

Haruka fechou a cara e Michiru colocou a mão na testa e revirou os olhos. A loira então pigarreou, retomando a atenção dos outros.

- Na verdade, eu poderia tocar nos ensaios alguns clássicos, ajudaria a entrar no clima e...

- Ou você poderia compor a música tema da peça, Tenoh-kun. Não deve ser difícil pra você, deve? – Takeo cortou-a. Desafiara a velocista sem cerimônias.

Percebendo a surpresa de Uranus, que logo viraria irritação, Neptune retrucou calmamente.
- Composições levam mais tempo do que imagina Takeo-kun. E tempo realmente é o que mais nos falta no momento.

- Pois eu acho uma ideia genial! – adiantou-se Eri com entusiasmo, os olhos voltando a brilhar. – Vai dar muita personalidade à nossa peça!

A expressão da recém nomeada diretora era de quem já contava com um aperto de mão do diretor do Mugen e inúmeras fotos no jornal do colégio. Os alunos viraram-se e fixaram o olhar na corredora, silenciosamente pressionando-a pela confirmação.

Da violinista, Uranus olhou para Takeo Ishikawa e, só pôde concordar com a cabeça. Para alegria quase assustadora de Eri Nakamura.

[...]

A aula de história não acalmou os ânimos do 1º ano A. Agitados, os adolescentes aproveitavam os momentos em que o professor escrevia no quadro para cochichar e trocar bilhetes. O assunto ainda era o mesmo do começo da manhã: A peça.
A própria Michiru havia cedido ao burburinho e questionado na ponta do caderno o que raios tinha sido aquela ideia de Haruka. A loira, ao ver a pergunta, apenas deu de ombros e desviou o olhar. A violinista suspirou.

Ao toque do intervalo, o professor deu um suspiro e largou o giz no canto do quadro, estava certo que se naquela aula os alunos ouviram dez palavras suas, era um milagre. Com dois livros debaixo do braço, o homem empurrou a porta deslizante para o lado e antes mesmo que pudesse sair, Eri Nakamura levantou e ficou à frente da turma.

- Pessoal! Silêncio! – a garota acenou mas os alunos continuaram a tagarelar.

O professor deu um último olhar cansado, balançou a cabeça e fechou a porta.

- Ei pessoal! – insistiu a menina – O que acham de irmos à sala agora de música ver Tenoh-kun tocar?

A conversa cessou e os jovens entreolharam-se. Yuna foi a primeira a concordar.

- Ótima ideia! Vamos logo antes que o intervalo termine. – falou Yuna enquanto limpava os óculos na barra da blusa.

- Haruka? – chamou Michiru, cutucando a loira que descansava cabisbaixa na carteira.

A velocista piscou sonolenta e fitou Nakamura, que mostrava olhos ansiosos pelo concerto. Sem perder tempo, Eri puxou a garota por um dos braços e manteve-se agarrada a ele, deixando de notar Neptune afundando a ponta da caneta no caderno. Uma mão só.

Tangendo os alunos como se eles fossem gado, a diretora da peça conseguiu reuni-los na sala de música, que ficava no bloco ao lado do prédio da sala de Artes.

Takeo Ishikawa cruzou os braços e espiou Haruka com olhos descrentes quando ela ajeitou-se no banco do piano de cauda. Esperava uma melodia simplória, daquelas aprendidas nas primeiras lições de música. Alguma que qualquer criança saberia cantarolar.

Michiru não disse nada. Nem no caminho nem na sala. Com o caderno debaixo do braço, manteve-se quieta esperando a loira começar a tocar. Pensou que não havia sentido em guardar aquele segredo e depois a parceira simplesmente despejar a informação em cima de Eri Nakamura.

“O que será que ela pretende com essa história de tocar piano na peça?

Haruka fitou as teclas, posicionou os dedos sobre elas e corrigiu a postura. Há anos não tocava para tanta gente. Vinte e duas pessoas, mais precisamente. As duas restantes preferiram o refeitório, suas barrigas reclamaram durante a aula de História.

A mão direta fez um leve movimento sobre as teclas e logo a esquerda acompanhou em um compasse ininterrupto. Os colegas trocavam olhares surpresos, que só aumentaram quando perceberam que sequer a loira espiou a partitura. Escolhera um solo que guardara com carinho, primeiro na mente e depois na segunda prateleira da sala em seu apartamento, sob forma de cd. “Prelúdio em sol menor Opus 23 era a música; Rachmaninoff, o compositor.

A violinista esboçara um sorriso, adorava aquela música.

Seus dedos passeavam em um caminho que sabia de cor. Poderia tocar quase todas as faixas do disco de olhos fechados. Quando terminou, Michiru, que exibia um largo sorriso foi a primeira a aplaudir, imitada dois segundos depois pelos outros alunos, ainda perplexos. Naquela sala, todos concluíram mentalmente que o talento de Haruka ultrapassava o mediano. Sua desenvoltura deixaria a Professora de música fascinada e até um tanto envergonhada...

Takeo tinha a boca entreaberta, que logo tratou de cerrar. Não esperava por aquilo. Olhou Michiru de soslaio e notou o grande sorriso. Torceu parte do roteiro. Como conseguir aquela mesma expressão dela?

As meninas pareciam mais encantadas que nunca pela corredora e Eri deu-lhe uma tapinha nas costas. Uranus soltou uma risadinha acanhada.

- Está decidido, Tenoh-kun! Você será meu pianis...digo, o pianista oficial dessa peça. Pode vir aos ensaios tocar! – disse Eri.

Ainda sentada no banco, Haruka fitou Michiru e esta ergueu a sobrancelha, que denunciava seu incômodo ao ouvir o comentário de Nakamura. Eri e os outros se puseram a conversar e esboçar cenas em que usariam o revelado talento de Uranus. Já Takeo, aproximou-se de Neptune e, afastando gentilmente uma das pontas do cabelo dela para trás, apoiou um dos braços no ombro da garota. Surpresa, a violinista ficou imóvel ao contato. Ia dar um passo para o lado quando o rapaz falou.

- Olha, até que foi interessante esse solo... – olhou a loira rapidamente –Embora eu prefira muito mais violinos. Seria realmente ótimo ouvir um concerto particular seu Kaioh-san.

Haruka apertou o punho. Ishikawa apenas sorriu com cinismo. Então Michiru lembrou da aposta e de como Haruka despudoradamente devorou com o olhar as pernas de Sara Matsuda. Lembrou também como fervera em constrangimento mais cedo, quando a corredora sugeriu que o rapaz pesquisasse o que ela gostava de ouvir antes de ir para a cama.

“Vale provocar, não é?” – pedaços do diálogo no apartamento vieram-lhe à mente. A violinista esboçou um sorriso cheio de malícia. Olhou para o relógio. 11h59. 12h00.

- Não costumo oferecer concertos particulares, Takeo-kun. É bem raro. – fitou Haruka antes de prosseguir – Mas fico feliz em saber que aprecia solos de violino. Se tiver interesse, aviso quando for me apresentar. Será meu convidado.

Os olhos do rapaz brilharam. Os de Uranus eram puro ciúme.

- Aceito com prazer. – respondeu Ishikawa por fim, exibindo um largo sorriso.

Pouco a pouco os alunos foram se dispersando. Alguns ainda estavam realmente empolgados com o solo de piano e levaram a conversa até o refeitório. Contudo, Takeo parecia não querer desgrudar de Michiru e Haruka o encarava, com uma das mãos no bolso. Queria esconder o punho ainda cerrado. Foi só quando a violinista se afastou um pouco que o rapaz fingiu uma tosse e deu uma risadinha.

- Kaioh-san, nós podemos conversar mais no refeitório sobre a peça, se quiser. – disse ele tranquilamente.

- Ah, que pena. – falou a loira se aproximando dos dois – Porque eu também preciso conversar com ela.

Michiru olhou de um para o outro. Era um tanto divertido ser espectadora.

- Mas é a Kaioh-san quem decide não é mesmo?

- Desculpe Takeo-kun, mas hoje fico por aqui... – falou a violinista gentilmente.

- Tudo bem... – o rapaz estalou a língua nos dentes e deu de ombros. – Mas antes de ir, quero dizer que achei bem interessante sua apresentação, Tenoh-kun.

- Obrigado. – os olhos da loira eram inexpressivos.

- Quer dizer, é piloto...pianista... O que mais sabe fazer além dessas coisas e de dar em cima de cinquenta garotas ao mesmo tempo?

Uranus não estava mais suportando a presença de Ishikawa. Ultimamente ele parecia se esforçar para encontrá-la e provocá-la. Foi o que conseguira no momento.

- Não sei...que tal ver se consigo tirar quatro dentes de uma vez em um soco? – a loira respondeu impaciente e o garoto ergueu as sobrancelhas.

- Ora, está mal-humorado hoje, hein?

Neptune apenas assistia ao pingue-pongue.

- Não, socos em idiotas sempre me deixam feliz.

- Ok, ok, estou indo...cuide bem da minha Viola, está bem?

- Claro, e você, arrume um Plano de Saúde... é sempre útil.

O rapaz saiu e a loira teve certeza que ele exibia um sorriso no canto da boca. Se antes ele a tratava com uma estranha cordialidade, agora nem se preocupava em maquiar suas palavras, que ultimamente estavam carregadas de provocação. Michiru lhe abrira espaço para uma conversa e até aceitara – de modo sutil – algumas de suas brincadeiras. Ishikawa estufara o peito de confiança e a velocista teria o maior prazer em estourá-lo.

- Parece que arranjou um amiguinho, Michiru. – falou a corredora com um meio sorriso.

- Você também... – respondeu a violinista, com a mesma expressão.

- Hã? Quem?

- Por favor, Haruka. Não deve nem saber o nome dela, já que as únicas coisas a prestar atenção foram as pernas.

Neptune cruzou os braços, aborrecida e Uranus passou a mão pela nuca, confusa. Então lembrou o breve episódio com Matsuda e sorriu. Os hematomas. No entanto, ao abrir a boca para explicar-se sentiu uma pontada no estômago. Foi como se retorcessem suas entranhas. Empalideceu e ficou arrepiada. A violinista pareceu perguntar algo, mas a corredora não ouviu.

- C-Conversamos depois... – murmurou Haruka antes de correr.

Michiru enfureceu-se. No meio de uma conversa sobre fidelidade viu a parceira acovardar-se e simplesmente correr. Deixada sozinha na Sala de Música, apertou o caderno com as duas mãos, furiosa. Pensou que talvez resolvesse aproveitar o resto do intervalo e conversar com seu novo parceiro, Takeo...

“Quem sabe assim você toma coragem para conversar, Tenoh...”

Longe da violinista, Haruka pôs uma das mãos na barriga. Dirigiu-se às pressas à enfermaria. A dor no estômago piorara.

“A omelete!” – lembrou-se a loira com pavor.

(continua)

3 comentários:

  1. essa cap ficou muito bom! ri muito com o mal-entendido entre as duas... coitada da haruka, dessa vez ela não fez nada!!!

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  2. Muito obrigada! Que bom que se divertiu com o capítulo. Michiru já castigou Haruka sem saber, com a omelete horrível hahaha.

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  3. A fic é ótima!! Mas não consigo imaginar a Michiru dando confiança para outra pessoa... Além disso... Não entendo pq elas não falam que estão namorando, se até a família dela já sabe...

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