terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Capítulo 11 - Reencontro


Capítulo 11 – Reencontro.

- Xeque-mate.

- Ara...isso não é justo.

Em uma tarde, as jovens enfrentavam-se no xadrez. A violinista tentava disfarçar seu aborrecimento, mas seu rosto denunciava-a, fazendo com que Haruka desse gargalhadas. Michiru era péssima perdedora. Tentando acalmar-se, tomava o resto do suco que lhe fora oferecido. Contudo, logo o colocaria no lugar quando viu a loira atender a campainha. Era um dos funcionários do prédio, que lhe entregara uma carta.

- Ora, vejam só... – sorria a loira enquanto rasgava a lateral do envelope.

Carta de uma fã. O envelope rosa dava algumas pistas de seu conteúdo, assim como o perfume que o acompanhava. Dentro, havia também uma foto da moça. Não era tão bonita, mas pouco importava, Michiru não estava de bom humor; já que não podia rasgar as fãs, pelo menos suas cartas...

- Eu espero que o lixo da cozinha não esteja cheio... – falava de modo aterrorizantemente calmo.

- Ahh, Michiru... – ria – Ela fez com tanto capricho.

- Não me importa... – cruzava os braços.

- Ué...essas meninas projetam seus sonhos em Tenoh Haruka princesa, seria um desrespeito rasgar... – brincava.

- Desrespeito é mandar fotos para uma pessoa comprometida.

- Muitas delas não sabem que sou...comprometida...aliás, nem do “A” do “comprometida!” – ria.

- Você e suas desculpas. Bem...só não se esqueça de que eu também recebo cartas, dos meus fãs.

- Ok, essas sim são um absurdo...um monte de marmanjo chorando por você.

- "Eles projetam seus sonhos em Kaioh Michiru." – retrucava.

- Eu sei muito bem o que pensam enquanto vêem suas fotos nas revistas e escrevem essas porcarias!

- Pior do que as coisas que você pensa não são...

- Mas você gosta de cada linha de meu pensamento... – a loira sorriu maliciosamente.

- E-Eu...estávamos falando das suas cartas, não estávamos? – desconversava.

"Querido Tenoh, eu acompanho sua carreira desde quando entrou para equipe de F1...eu observava como você corria com tanta...paixão...e acho que isso despertou um sentimento de..." – lia.

- Mas por que raios que você está lendo isso? – arranca a carta da mão dela – O "sentimento" que essa aí vai ter se continuar com isso, é arrependimento de ter nascido!

- Ei! Minha carta!

- Quer parar de ler essas coisas? – Michiru rasgava o envelope, jogando sem pressas os pedaços no chão. 

- V-Você rasgou... – dizia abismada.

- Bingo...

- Você não tinha o direito de fazer isso! 

- Kami-sama! Quer fazer o favor de responder por que lê isso? – a observava realmente enciumada.

- Você não tem coração Michiru? Se ela descobrisse o que você fez ia morrer de desgosto...

- Quanto exagero...

- E era tão jovem, e gatinha, e fã de corridas e...

- “E” tem sorte de eu ter rasgado a carta dela, porque se eu soubesse o endereço dessazinha, aí que ela ia morrer mesmo...

- Uma coisa que adoro...é que os fãs nunca terão oportunidade de vê-la com ciúmes e vermelhinha de raiva... – sorria se aproximando.

- Você brinca demais com fogo... Bom, com água, trocadilhos infames à parte... – ria deixando-se envolver num abraço.

- Não posso evitar, o vento às vezes atiça o mar, não? – a beija – Não sei se notou, mas atrás de você só há uma parede. Não vai ter escapatória sabe? – ria.

- E por acaso eu deveria querer escapar? – sorria, fechando os olhos.

- Mesmo se corresse não haveria como fugir de mim, Neptune. Nem por terra, nem por ar...talvez pela água, mas só talvez... – encosta-a na parede onde a beija mais uma vez, agora demoradamente.

- Ara...Talvez? Mas não se preocupe, eu não pretendo. – sorri.

- Princesa, afinal...quantos botões têm esta blusa?

- Que impaciência... 

Fechando os olhos mais uma vez, Neptune esperava outro beijo de Uranus. Não veio. Uranus olhava fixamente o chão, parecia querer lembrar de algo. E antes que a violinista pudesse fazer ou dizer algo a expressão da loira muda. Os olhos arregalados antecipavam um evento que Neptune estava com medo de descobrir...

- Michiru!

- Que foi?!

- Esquecemos da competição!

Entreolhando-se com terror, as duas se separam, correndo agora atrás de seus uniformes. Por motivo de força maior – bem, a companhia uma da outra – tinham esquecido suas respectivas competições. O Mugen também selecionara estudantes pertencentes a outros colégios e hoje, seria o teste. Os alunos de fora que conseguissem posições proeminentes, concorriam a ótimos prêmios, inclusive uma bolsa de estudo. Felizmente, as garotas chegaram a tempo da competição. Haruka lamentara o caminho todo; não teria a oportunidade de ver sua amada de maiô: as provas seriam realizadas ao mesmo tempo...

[...]

Enquanto Neptune fazia jus ao seu codinome, Haruka se posicionava na pista, concentrando-se ao sinal da largada. Ouve o tiro. Correu como sempre, em companhia daquele que era sempre fiel. Vitoriosa ao final, era parabenizada pelos concorrentes. Um toque no seu ombro, em especial, chamou-lhe atenção.

“Parabéns...Haruka.” 

“V-Você... não a reconheci...” – dizia ainda surpresa.

Nem poderia. Elza Grey estava bem diferente do que conhecera. Cabelos mais longos; ainda mais rápida e confiante. Chegara em segundo lugar, mas dessa vez não lamentava. Estava quase convencida de que não poderia derrotar... o próprio vento. 

Não era a primeira disputa que travara com Haruka. Estudara no mesmo colégio da loira, antes que a mesma pedisse transferência para o Mugen; tempos que lembrava com nostalgia...

Elza Grey sempre foi uma garota falante. No colégio, era daquelas que pedia a borracha para começar uma amizade com o novato ao lado. Ou aquela que o chamava para lanchar perto no intervalo. Simples gestos que selaram vínculos com várias pessoas, dentre elas uma estudante chamada Kaioh Michiru. Talvez Grey tivesse se identificado com a moça, uma empatia com um estado conhecido. Solidão. A esportista passara momentos delicados, sem conhecer ninguém na cidade além de seus pais. Anos antes, sem muita escolha deixara a Inglaterra, seu colégio, seus amigos e boa parte dos sentimentos.

O povo e a língua local trataram de dificultar sua adaptação. Reservados, os japoneses em seu convívio falavam apenas o suficiente, rápidos e educadamente... Jurando a si mesma que iria se adequar, Grey persistiu. E veio Fumino, seguido por Taiki, Rika, e Eriko. Pessoas que Elza conseguira conquistar; nacionalidade, sotaque e modos já não importavam tanto...

Quando viu Kaioh sentada cabisbaixa desenhando, sorriu para si mesma. Era a Elza de anos atrás. Com uma diferença: a violinista poderia se considerar sortuda, Grey iria dar o primeiro passo. Sentando uma cadeira à frente, perguntou o que a Sailor desenhava, porém, olhando com mais atenção reconhecera os traços.

“Ei... é aquela garota, não é? Da turma B... como é o nome mesmo?”

“Tenoh Haruka...” – disse Michiru, sem fitar a jovem.

“Isso mesmo, você a conhece?”

“Não exatamente.”

“Gostaria?”

Michiru parava, agora encarando Elza, que sorria.

“Gostaria de conhecê-la? Eu disputei com ela algumas vezes, fiquei sempre em segundo... É vergonhoso eu sei, mas um dia eu vou superá-la. Pode me desenhar na frente dela!”

Grey ria, apontando o papel. Michiru continuava desenhando, dessa vez sorrindo de leve.

“Você vai perder o intervalo... Suas amigas devem estar esperando por você lá fora.” – disse Neptune, escutando meninas chamarem por Elza da quadra do colégio.

“Não estou perdendo, estamos conversando, não? E além disso, se quiser que eu saia, é só dizer.” – sorria.

“Não... eu não quis dizer isso, é que...”

“Relaxa, estou brincando, Michiru-san.”

O tratamento íntimo e o sorriso da amigável estrangeira desarmaram momentaneamente Neptune, que, fechando o caderno de esboços estendia a mão, cumprimentando-a.

“Prazer em conhecê-la, Grey-san.” – o sobrenome fora guardado enquanto a professora fazia a chamada.

“Elza, por favor. Eu sei que o “L” não ajuda na pronúncia, mas prefiro ser chamada pelo primeiro nome, sim?”

“Ok, Elza-san.”

“Olha... ainda está de pé o que eu disse. Se quiser conhecer essa garota que desenhou, me procure.”

“Obrigada, vou me lembrar disso...”

E naquela época, Elza Grey era o mais próximo que Michiru poderia chamar de amiga, ainda que não se permitisse ter laços mais profundos. Não ainda... não com ela...

[...]

Perto da pista de atletismo, a disputa de natação terminava: Kaioh Michiru também vencera. Ainda enxugava os cabelos, quando para seu espanto, a velocista entrava no ginásio, acompanhada. Dando uma discreta torcida na toalha, forçava um pouco os olhos a fim de averiguar se conhecia a garota. Prestando atenção ao rosto, reconhecera a amiga com um sorriso.

- Elza! Há quanto tempo! Vejo que também disputou a corrida, como foi? – perguntava animada.

“Michiru! Que bom te ver.” – sorria – “Bem, disputei sim, mas fiquei em segundo. Mas também não é justo...” – olhava para Haruka, rindo.

- Mas...você fez uma ótima prova. – Uranus dizia um tanto corada pelo elogio.

“Obrigada Haruka. A propósito, parabéns Michiru, vejo que também ganhou” – sorria, estendendo-lhe a mão.

- Ah, muito obrigada, Elza. – sorria de volta, aceitando o cumprimento.

“Bom...quer dizer que estão juntas?”

- Como assim?! – diziam as Sailors em uníssono. De fato, Elza dera ambigüidade à pergunta, propositalmente. Estava começando achar tudo muito...divertido.

“Na...classe. Vocês não estudam juntas agora?” – perguntava, segurando uma risada.

- A-Ah...sim, sim...estudamos. E-Eu vou me trocar no vestiário e já volto... – dizia Neptune ainda corada.

Discretamente os olhos da loira passeavam pelo corpo da parceira, agradecendo enfim o privilégio de vê-la com o uniforme de natação. Contudo, sua expressão logo mudaria ao notar que alguns meninos faziam o mesmo. Franzindo o cenho, amaldiçoava-os mentalmente, sabia no que estavam pensando. Elza, observadora, riu baixinho antes de falar com Uranus.

“E então Haruka, a Michiru não é...fantástica?” 

- É... ela é sim. – sorria de volta. Falando de uma forma gentil que Elza não conhecia – Oe...estamos indo a uma sorveteria, não quer nos acompanhar? A entrega das medalhas será daqui a quarenta minutos, creio eu.

“Eu...não vou atrapalhar vocês duas?” – olhava momentaneamente para Michiru, já de volta, verificando se havia problema.

- Ah, de forma alguma. – Michiru respondia, animada por reencontrá-la.

Já no local, Haruka sentara ao lado de Michiru, como se acostumara, mas os olhares de Elza, que parecia se divertir com a situação a deixaram corada. Notara que parte de sua privacidade estava prestes a ser vasculhada. Grey ria.

- Q-querem que eu faça os pedidos? – falava a loira estalando os dedos.

"Por mim tudo bem..." – Grey dizia contendo um riso.

- Hai, por mim também – Michiru olhava Elza discretamente. Algo naquele sorriso era familiar... A violinista se lembrava dele... De quando Elza sabia de algo e tentava fingir que não. – E então, o que tem feito?

"Bom, treinando...estudando. Viajando à outras cidades...sabe como é... assim que o colégio descobre que você tem uma habilidade, logo pulam em cima.” – brincava – “E vocês?”

- Sim, sei como é... Bom, eu tenho participado da orquestra... consegui alguns concertos...essas coisas... Ah sim, e às vezes ainda participo de competições, como a de hoje.

“E você, Haruka?”

- “Encarando saiazinha e salto-alto, namorando Michiru, matando monstros e ganhando algumas corridas” Ah...quase o mesmo... E-eu vou pegar...os sorvetes... – dizia Haruka com um sorriso nervoso.

A reação da loira fizera Michiru pensar. Queria dizer algo para quebrar o gelo... Mas nada que não envolvesse Sailors ou a própria Uranus que lhe passava pela cabeça... Vendo Uranus sair, Elza curva-se um pouco e cobrindo parte da boca com a mão pergunta à violinista: “Ora, parece que Haruka perdeu...um pouco do medo de falar com as pessoas...Não é, Michiru?”

- C-como?

“Bom...ou talvez ainda não tivesse encontrado uma pessoa especial...” – sorria, como se soubesse de algo que Neptune não parecia querer revelar.

- "Elza sempre foi assim. Mas você sempre achou isso muito engraçado, não é, Michiru? Isso quando não eram com você as insinuações... ótimo... agora pense em algo"Ara... as pessoas mudam com o tempo, não é? – respondeu ela, por fim.

"Claro, claro...depois do nosso último encontro também resolvi mudar. Não só o cabelo afinal... Bom, mas quem sabe eu não volte ao antigo visual?” – ria enquanto via a corredora voltar ao lugar com os pedidos.

- Aqui estão os sorvetes. Bom, tirando em segundo lugar, significa que você pode ganhar uma bolsa, não é? – perguntava à Elza enquanto sentava-se novamente.

“É verdade, mas esse não era meu interesse principal. Vim ao Mugen, porque sei que aqui se encontram alguns dos melhores atletas. E, acabei te encontrando. Uma revanche não esperada.” – sorria.

- Mas você ficará no Mugen? – perguntou Neptune.

“Provavelmente não. O ritmo desse colégio exige demais dos estudantes e consome um tempo que gostaria de focar em outras coisas. Além do quê, minhas notas não estão lá perfeitas.” – sorria, enquanto tomava mais um pouco de sorvete.

- Física? – questionava Michiru.

“Sim, é ainda meu karma...a professora também não ajuda...” – suspirava enquanto brincava com a calda do sorvete.

- Oe... pior do que nosso professor não pode ser. Eu juro que em outra encarnação cortei a cabeça dele na batalha de Sekigahara... – falava a velocista, imitando um golpe com a pequena colher.

- Agradeça por ele não ter te expulsado como fez a professora de artes... – disse Michiru dando uma risadinha.

“Nossa, e por que ela te expulsou Haruka?” – Elza parecia realmente interessada o suficiente para não notar a expressão de terror no rosto de Michiru, que sem querer, falara demais...

- Eu mandei um bilhetinho para Michiru na aula e ela viu... – falara a loira com naturalidade. Tinha sido sincera afinal... Michiru discretamente suspirava de alívio. O conteúdo do bilhete estava a salvo.

“Ah, só isso? Que professora horrível...”

- Ah... Elza, depois de amanhã iremos estudar na minha casa, se quiser nos acompanhar... Haruka é boa em Física. Poderia dar algumas dicas... “O que estou falando?! Elza não vai descansar enquanto eu não confessar que estou com Haruka! Por que raios a convidei? Minha educação deve estar no piloto automático! Mas que droga!” – mentalmente Neptune desesperava-se, entretanto, anos de prática não a deixavam mostrar... ou quase, já que derramara calda de morango em sua saia.

- Se estiver tudo bem para você, Elza... – respondia Haruka ingenuamente, completamente alheia ao estado de sua parceira.

“Baka!!” 

Pensou a violinista arqueando uma sobrancelha e forçando um sorriso para Elza, esperando que os deuses interviessem naquele exato momento. Do contrário, fingiria um desmaio por excesso de açúcar na calda do sorvete. E sim, deveria ter estudado mais biologia. Ganharia credibilidade quando fosse explicar porque sofrera aquilo.

“Bom, eu aceito então” – sorria Elza, encarando por um momento Michiru, que mexia obsessivamente a colher na taça de sorvete – “Mas não vou incomodar mesmo? Quer dizer, devem estar acostumadas a estudarem sozinhas...” – disfarçava um sorriso antes de limpar a boca com o guardanapo.

- Não, você será bem vinda... "Kami-sama, o que eu fiz??"

Elza tinha razão. Estudavam sozinhas. O que poderia explicar o motivo dos cadernos de estudo das duas garotas estarem completamente limpos...

(continua)
  

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